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Livremente iguais

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Pelo menos duas vezes na semana costumo passear com meu cachorro pelo bairro e eu não consigo me lembrar, até hoje, uma vez em que eu não tenha me sentido intimidada ou até mesmo agredida por palavras, olhares ou gestos de algum homem.

Sou casada e me mudei algumas vezes de cidade para ficar mais próxima do meu marido e não foram poucas as vezes em que eu tive que escutar, inclusive da minha família, que a vida era assim mesmo, a mulher tinha que acompanhar o marido e que eu nem podia imaginar a possibilidade de deixá-lo vivendo sozinho, pois casamento onde a mulher não cuida do marido, não dá certo. Em meu ciclo de amizades, tanto homens como mulheres vivem reproduzindo discursos machistas, que de alguma maneira desequilibram o gênero, diminuem a mulher, baseados em uma cultura de preconceito e desigualdade. “Nossa, mas você trabalha até tarde, quem faz a janta pra vocês?” , ” Você vai viajar e vai largar o seu marido sozinho uma semana, é muito tempo”, “Não adianta, você fez uma escolha. Agora terá que pensar na sua família e não mais na sua profissão.” E além disso tudo, imaginem o que falaram quando eu resolvi que não colocaria o sobrenome do meu marido ao final do meu nome quando nos casamos…

Todos esses exemplos podem até ser pequenos se comparados a casos de violência contra a mulher, casos explícitos de desigualdade de gênero, ofensivos, esmagadores, silenciosos e dolorosos, mas não deixam de ser casos que muitas mulheres já vivenciaram ou vivenciarão pelo menos alguma vez na vida.

Esses dias uma colega postou no facebook que um menino da escola de sua filha, que tem 5 anos, a havia ameaçado de apanhar porque ela era menina e então a pequena respondeu, eu sou menina mas eu sou forte, pode vir que eu sei me defender! Então a mãe escreveu: pais, ensinem seus filhos a respeitarem o próximo e ensinem suas filhas a serem empoderadas! Eu fiquei pensando sobre essa palavra PODER e o quanto ela exerce domínio sobre as relações. Sou bailarina e professora de dança e a minha profissão me faz refletir todos os dias sobre questões sócio -culturais. A dança me fez enfrentar muitos preconceitos e me ensina cada vez mais sobre a igualdade, sobre não precisar ter mais poder sobre alguém para ser respeitada, sobre não precisar me vestir dessa ou daquela maneira para caminhar em público sem me sentir intimidada, sobre não julgar o diferente, sobre não precisar abafar sentimentos, sensações e desejos para atender às necessidades de um outro alguém, sobre ser livre, sobre movimento, fluxo, sobre o feminino, o masculino, o homem, a mulher, o ser humano, o corpo! Não gosto de radicalismo, mas acho que o grito da mulher precisa ser ouvido, é uma inquietude que nos acompanha de geração em geração e mesmo que hoje haja mais espaço para nos manifestarmos sinto que ainda tememos a fala, a escrita, a expressão… Ainda há repressão, ainda há preconceito, ainda há muito o que dizer.

Se eu pudesse dançar esse texto eu acho que eu me despiria e ficaria girando de olhos abertos para o mundo, na esperança de que alguém pudesse compreender a magnitude de um ser sem impregnações, sem casca, sem sexo, livre e igual a todos os outros: humano!

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Bruna Bellinazzi Peres – bailarina, formada em Dança, mestre em Artes Cênicas e doutoranda na mesma área, realiza pesquisas sobre processos de criação em dança. Atua também como professora de ballet clássico e dança contemporânea para crianças e adultos.