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Dias de quarentena – Brasil março 2020

Dias atrás, minha amiga Adriana Chebabi me pediu para escrever um texto para o site Belas Urbanas: das outras vezes, disse que não tinha tempo, dessa vez, em plena quarentena, seria impossível dar essa resposta, porém informei que estava triste e até com raiva de tudo que estava acontecendo, da falta de consciência do povo em relação ao Covid e pedi para ela esperar um pouco, pois senão o texto sairia meio ácido. Ontem, no entanto, aconteceu algo que acho que deveria ser contato para vocês, leitores do Belas.
Comecei a quarentena sozinho, mas no 9º dia liguei para os meus pais e vi que, por alguns motivos não legais de lembrar e nem de falar por aqui, eles não estariam seguros no sítio deles. Eu os trouxe então para cá e, a partir disso, redobrei o cuidado com tudo, pois eles são idosos (meu pai tem 80 e minha mãe, 78). Antes de ontem, vimos que estavam já faltando alguns itens de alimentação. Tenho evitado ao máximo sair, mas pensei: dessa vez, não vai ter jeito. Comecei a pensar em mercados que me expusessem menos ao risco: hipermercado nem pensar, o mercadinho aqui perto de casa tinha fechado às 13h, lembrei-me, então, de um de médio porte a 3 km da minha casa. Liguei para lá e vi que funcionaria até as 22h. Ótimo: vou às 21h30 e não vai ter ninguém. À tarde, começou a chover: PERFEITO! Não vai parar de chover e vai ter menos gente ainda, e tudo deu certo, principalmente porque a chuva foi até as 21h15, comemorei de alegria! Desci na garagem acompanhado de minha fiel escudeira, a cachorra Lau: sempre que saio de carro, eu a levo, pois ela fica “P” da vida se não for junto passear.
Chegamos ao mercado, estava do jeito que eu queria, pois não tinha vivalma, fora os funcionários. Parece loucura, né, mas para entrar e sair bem rápido, eu mal escolhia os itens ou pesquisava preços: quanto menos ficasse ali, menos exposto ao vírus estaria. Na hora de pagar, foi a consagração: tinha dois caixas e ambos vazios, corri no mais perto, passei as compras (me espantei com o total hahaha) e corri em direção ao carro. Quando me aproximava dele, ouvi ao longe uma voz muito dissonante e não entendi o que era: com a visão de canto de olho, vi que tinha alguém parado num poste, deve ser um mendigo ou casqueiro (usuário de crack) – nesse mercado geralmente tem alguém assim. Nem dei atenção porque sabia o que ele queria. Na verdade, a minha pressa de ir embora e as medidas de proteção que pedem para seguirmos me impediram de ser mais atencioso com ele.
Abri o porta malas, a Lau pulou lá de dentro para seu rolezinho costumeiro e comecei a colocar as compras rapidamente. Quando vi, a mesma voz dissonante estava bem mais perto, não entendia nada e me mantive de cabeça baixa e velozmente guardando as compras. Quando terminei, tinha que levar o carrinho de volta e aí não teria escapatória: teria que encarar o dono da voz. Quando o fiz, me deparei com um sujeito maltrapilho com uma cicatriz de cirurgia de lábio leporino bem pronunciada e com uma deformação severa em uma de suas narinas. Quando eu era criança, minha mãe me falava: “Toda vez que você vir alguém com algum defeito físico, não encare, não aponte e principalmente não pergunte o que foi”. Entendi porque sua voz era tão incompreensível e aí me desarmei. Putz, como deve estar difícil a vida desse cidadão! Perguntei o que ele queria e ele, mais devagar e com mímicas, deu a entender que queria apenas uma moeda. Fui para o console do carro, onde ficam as moedas, e vi que tinha algumas, mas a frase da minha mãe e a atual situação me fizeram pensar: Poxa, o que custa dar algo a mais para esse cidadão? Eu costumo dar moedas a quem me pede, não me importa o que a pessoa fará, eu sei que sempre recebo em troca um sorriso e um agradecimento sincero, sem falar que antes de dar as moedas, eu brinco um pouco com a pessoa, acho que é o fato de ser artista, palhaço, brincalhão por natureza, então peguei minha carteira e vi que tinham, separadinhas, várias notas de R$ 2,00. Eu me virei orgulhoso e entreguei: quando ele viu aquele montinho de dinheiro, me olhou bem nos olhos e, em fração de segundos, me deu UM ENORME E CALOROSO abraço. No meio do abraço, pensei : “Affff Maria”, lá se foram todas as precauções que tive! Ele terminou o abraço pegou minha mão direita com as suas duas mãos e fez um discurso de agradecimento. E eu, “Afff Maria” de novo, tá piorando! Terminando seu discurso, ele foi saindo todo feliz com seu dinheirinho e eu fiquei meio petrificado com tudo aquilo. Para aumentar meu desespero, ele viu a Lau, aí brincou com ela e perguntou se era minha. Quando eu disse que sim, lá vem ele de novo me contar do seu amor por cachorros, com toda a sua dificuldade de fonação e bem pertinho de mim. Coloquei a Lau para dentro do carro, ele aproveitou que tinha se aproximado para conversar sobre a cachorra e tascou-me mais um abração. E de novo fez uma loa de agradecimentos.
Muitas vezes, ajudei pessoas que pedem. Como disse, nem ligo o que elas farão com o dinheiro e, por vezes, fiz compras para esse pessoal. O que querem é só alguém que as olhe nos olhos, que converse com elas sem temor, querem ser ouvidas e isso eu sei que às vezes vale muito mais do que qualquer donativo material ou financeiro. Caridade nem sempre deve ser material.
Entrei no carro, olhei para a Lau que com a linguona de fora e olhar de: Ah! Relaxa! falei :

– Tá nas mãos de Deus! Dei uma buzinadinha e um sorriso para ele. Só fiquei chateado porque, ante o susto e o temor por essa situação do corona vírus, não fiz as costumeiras brincadeiras que faço com essas pessoas que tanto necessitam de atenção.

Hugo Vidal – Belo Urbano, é jornalista, ator e diretor há 29 anos, gosta muito de descobrir novas paisagens rodando com sua moto, aliás uma de suas paixões é o motociclimo. 

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Espero que um dia… BRASIL MARÇ0 2020

Você já aprendeu a fazer seu dinheiro trabalhar pra você?

Já sabe como montar uma startup escalável em que outras pessoas trabalhem pra você?

Ou você precisa de uma furadeira, uma panela, um trator ou qualquer máquina para produzir algum bem?

Se você está nesse grupo, se é brasileiro, se é pequeno, ou pior, se gosta do seu trabalho, talvez hoje esteja se sentindo tão idiota como eu.

Espero que um dia haja comida, roupa, casa e serviços virtuais.

E que isso ocorra antes que todo o setor produtivo e de serviços
desista de continuar lutando.

Noemia Watanabe – Bela Urbana, mãe da Larissa e química por formação. Há tempos não trabalha mais com química e hoje começa aos poucos se encantar com a alquimia da culinária. Dedica-se às relações comerciais em meios empresariais, mas sonha um dia atuar diretamente com público. Não é escritora nem filósofa. Apenas gosta de contemplar os surpreendentes caminhos da vida.

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Para o nosso bem. Brasil março 2020

Para o meu bem..
Hoje é meu aniversário. É  mais um aniversário… Dia de festa. De comemoração. De agradecimento. De celebração. Mais um ano de vida…VIVA.
Mas também é dia de viver um isolamento social, a quarentena. Dentro de casa em encontros com nós  mesmos.
É dia de celebrar a vida. A saúde. Dia de alegria! Mas também é dia de saudade. De vontade de estar com a família. Do beijo do netinho. Do abraço dos pais. Do carinho dos filhos… Da comemoração social… De encontrar amigos. 
É um aniversário… dia de presenças e presentes. 
Mas é dia de sentir-se só,  de introspecção… apenas valorizando o simples, agradecendo a tecnologia, a ciência, a medicina e a saúde. Ela é a prioridade. 
Dia de aniversário.  É dia de abraço, de beijo, de aperto de mão. Mas hoje não é. Hoje não.
Hoje o aniversário é sem o contato físico. Sem o barulho da comemoração. Hoje é dia de olhar pela janela e ver as ruas vazias. Não há carros. Não há música. Não há pessoas. Não há festas. Estão todos em suas casas… Unidos e sozinhos ao mesmo tempo.
É dia de festa. Mas hoje não é….
É dia de surpresa no trabalho. Do carinho das colegas.. Da comemoração coletiva com as crianças. Mas também não é. Hoje não haverá crianças nem festa. 

É dia de aniversario, de comemorar… de ir a um show, de brindar, de música e risos no ar. Mas hoje não. 
Hoje a comemoração será virtual. Coletiva a dois. 
Mas hoje é o dia de aniversário. Dia de ser lembrada. Dia de receber amor e carinho da família e dos amigos. É dia de parabéns no modo virtual.
É parabéns. É para o meu bem. 
Sim.. acreditem! o significado de Parabéns é: “para seu bem”. Que lindo! Então…Que para meu bem e o bem de quem amamos este aniversário tenha a comemoração mais linda que poderia ter. Que a distância signifique amor. Que o amor signifique cura e que mais do que nunca tenhamos fé. 
Daqui um ano, se Deus me presentear com vida, estarei comemorando socialmente e ficará a lembrança dessa história vivida no dia do meu aniversário.
Parabéns! Para o nosso bem!

Vera Lígia Bellinazzi Peres – Bela Urbana, casada, mãe da Bruna e do Matheus e avó do Léo, pedagoga, professora aposentada pela Prefeitura Municipal de Campinas, atualmente diretora da creche:  Centro Educacional e de Assistência Social, ” Coração de Maria “

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EU E OS OUTROS – Brasil março 2020

Tive uma longa conversa comigo… Não que isso seja inédito, pelo contrário. Vira e mexe eu me pego travando diálogos internos, trazendo para argumentação críticas e insights recolhidos das minhas experiências, também das artes, dos livros, das peças e das pessoas que eu ouço aqui e ali…
Mas, dessa vez a motivação é nova: isolamento social (imposto pela pandemia covid19).
De um lado, o medo. Do outro, a responsabilidade pelo coletivo. Ou, num rompante filosófico: EU e OS OUTROS.
Dizer também que esse dilema nunca me alcançou, não é verdade. Mas, tomá-lo agora como uma regra eleita e crucial para o bem estar da maioria, é novidade.
Eu me questiono, sem nenhum compromisso: Como ficam os desejos burgueses de dar rolê no shopping para olhar vitrines? E, emendo uma questão bem mais relevante: Como faço para proteger a mim e minha família sem prejudicar a diarista que depende desse dinheiro para sobreviver?
A resposta seria suspender o serviço e manter o pagamento – seria o justo se eu como prestadora de serviço, também tivesse garantidos meus rendimentos. Numa tacada, de relance, já tenho num contexto ultra restrito um enorme conflito, com várias fontes de angústias.
Sem apelar para o romantismo das lições que procuram o lado positivo dos grandes problemas, fico imaginando o vírus de origem oriental, de veloz multiplicação, rompendo continentes, sem cerimônias.
Mais do que encarar a nossa vulnerabilidade, física e emocional, me parece o caso de compreendermos, de uma vez por todas, que as fronteiras geográficas são tolices que supostamente nos mantêm seguros.
Ironicamente, nesses tempos em que pessoas são impedidas de circular entre países, sem comoção por situações de fome, guerra e domínios ditatoriais que produzem comboios de refugiados – rejeitados, açoitados, humilhados, – um ser invisível atravessa todas as barreiras, em todo o globo, por terra, água e ar, destruindo a saúde, a economia, a força de trabalho, a liberdade… Um vírus.
O mapa do mundo pelos olhos do Corona é um todo indivisível, como divertidamente Wislawa Szymborska diz em um poema: (mapas) “um mundo que não é deste mundo” e, no caso da pandemia não há nada de divertido, é triste e cruel.
Então, o que nos desperta a solidariedade e a empatia de hoje é o medo da contaminação?
É por medo e não por respeito ou responsabilidade que nos fechamos em nossas casas e é exatamente neste ponto que eu me deparo com as hipóteses levantadas por Freud no século passado, quando ele próprio travava suas batalhas ideológicas que opunham ego e mundo e concluiu que somos seres, essencialmente, egoístas e os outros são nossa cortina de fumaça.

Dany Cais – Bela Urbana, fonoaudióloga por formação, comunicóloga por vocação e gentóloga por paixão. Colecionadora de histórias, experimenta a vida cultivando hábitos simples, flores e amigos. 

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A peste – Brasil março 2020

Quando me designaram escrever sobre a pandemia, logo pensei não vou dar conta pois nunca havia passado por uma cilada dessas. Uma sensação de total relevância à vida perante uma desconhecida doença. Nunca passei por guerra ou fome. Que gabarito tenho eu?
Porém, na última declaração “macacônica” do nosso chefe de estado sibilando palavras destorcidas da realidade, entrei no fronte com as narinas abertas para escrever lhe uma carta aberta:
Valha me Sr. presidente,
Então, está tudo bem?
“estatística comprova que o vírus novo atinge mais os idosos“
“voltem a sua rotina”
“economia não pode parar”
É graças a esses “velhos” que digito essas míseras palavras descontentes para lembrar que eles já foram jovens e fortes, criaram famílias, contribuíram economicamente e pagaram impostos e estudo aos filhos. Inclusive muitos o elegeram, infelizmente.
Esses velhos que já não tem vigor, tem rugas e flacidez que já não votam mais e sobrevivem de aposentadoria merecem respeito. Respeito que suas palavras enfadonhas não atingem.
A pandemia nos afastou em pequenos metros esterilizados, vivendo de mídias digitais em lares higienizados não somente do tato, mas do próprio pensamento.
Vamos ter que acertar essa conta que chegou para nós como esse vírus cobrando juros altos, todavia, nos tornando biblicamente iguais não importa o quanto é sua renda, a marca do seu possante, quantos boletos atrasados temos ou o nome do delivery.
Estamos sozinhos no impasse dessa reflexão, assim como meu pai, diabético, de longe me mandou um beijo da sacada de sua casa querendo se esbaldar em um abraço infantil.
Você errou senhor presidente, porque não nos considera iguais, humanamente iguais. Isolado está você.
Vença sua derrota e guarde sua máscara esterilizada e pantomímica de Souvenir.

Meg Lovato – Bela Urbana, formada em comunicação social, coreógrafa e mestra de sapateado americano e dança para musicais. Tem dois filhos lindos. É chocolatra e do signo de touro. Não acredita em horóscopo mas sempre da uma olhadela na previsão do tempo.
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Lá vem o sol… vai ficar tudo bem, afinal? Copenhague – março/2020

Sábado, 21 de março de 2020, 10h30 da manhã. Primeiro dia de primavera no hemisfério norte, e eu aqui, em Copenhague, contemplando este dia tão lindo e ensolarado da sacada do meu apartamento. No fundo, o rádio toca Here comes the sun, dos Beatles.

Seria um dia absolutamente normal de fim de semana, não fosse o fato de que um inimigo invisível está à espreita, obrigando-nos a estar confinados em casa, ou permitindo-nos sair somente em caso de extrema necessidade, e desde que mantenhamos uma distância segura de dois metros de outras pessoas, evitando tocar coisas e desinfetando-nos sempre que possível. Chega a parecer uma dessas sociedades distópicas, que vemos em filmes, em que há uma pseudo-harmonia, mas sob vigilância constante. Será que a chegada das estações mais quentes vai finalmente amenizar esta crise?

Leio as notícias mais recentes no website de um jornal dinamarquês – números atualizados de infectados, hospitalizados, em tratamento intensivo e mortos, estatísticas mundiais, declarações de políticos, planos de resgate para empresas falidas, instruções de higiene, análises de impacto econômico, depoimentos de profissionais de saúde, de pacientes, de gente que perdeu o emprego, que perdeu alguém da família, que está preso em um navio de cruzeiro sem poder voltar para casa. Dicas de como mudar hábitos, de como se manter em forma sem sair de casa, de bons filmes para assistir, conselhos de psicólogos de como explicar a pandemia para crianças. Notícias otimistas, notícias pessimistas…

Nos meios sociais, muitos memes para aliviar a tensão, mas também posts sérios, educativos, outros apocalípticos, assustadores, vídeos de pessoas contando suas experiências em países mais afetados, mensagens de esperança e de medo. Propagandas de novos produtos e serviços que solucionam problemas da era pandêmica. Conselhos caseiros de como se proteger e de como melhorar o sistema imunológico, teorias da conspiração, críticas a governos por não decretar medidas mais drásticas, ou por exagerar nas medidas, ridicularização de políticos, crises diplomáticas…

Todos querem expor suas verdades, suas teorias, suas sabedorias, suas mentiras, suas soluções, suas sátiras, seus comentários pertinentes ou idiotas, seus conselhos, os quais nos chegam pelos mais variados canais de comunicação, queiramos ou não, e que nos esclarecem, nos assustam, nos deprimem, nos influenciam, nos fazem pensar, reagir, analisar, opinar, rir, chorar…

Às vezes soa patético e ao mesmo tempo tudo parece muito estranho e é muito difícil saber como navegar nesse oceano de informações e desinformações, que ao mesmo tempo ajuda e prejudica nossa capacidade de dimensionar a realidade e pôr as coisas em perspectiva. Quem será o verdadeiro inimigo invisível?

Há breves momentos em que me desconecto e me esqueço desse inimigo, seja lá o quê ou quem for. Aqui dentro de casa, tudo segue normal. O sol continua a brilhar no lado de fora, ele me dá mais energia. Uma brisa leve bate no meu rosto e leva meus pensamentos para longe. Na verdade, não quero pensar em nada, não quero saber mais nada sobre este assunto, não quero tentar prever quanto tempo isto ainda vai durar, ou angustiar-me com o que ainda está por vir, não quero saber quem tem razão, só quero viver o agora. A primavera chegou, e neste exato momento, tudo está bem no meu mundo…

Meu marido vem ao meu encontro e me dá um abraço. No mesmo instante, meu telefone me avisa que uma nova mensagem de texto acaba de entrar. Não quero, mas não consigo deixar de abrir a mensagem: é a Polícia dinamarquesa nos lembrando: “O coronavírus está se espalhando na Dinamarca neste momento. Mantenha distância e mostre consideração – mesmo quando o sol brilha. Caso contrário não vamos conseguir diminuir a propagação da doença. Aproveite seu fim de semana!”

Miriam Moraes Bengtsson – Bela Urbana, formada em Comunicação Social/Publicidade e Propaganda pela PUCCAMP e possui mestrado em Comunicação e Inglês pela Universidade de Roskilde, na Dinamarca. Desde 92, atua nas áreas de mkt e comunicação. Natural de Garca, SP, vive atualmente em Copenhague, Dinamarca, com marido e dois filhos. Trabalha com comunicação digital e branding em empresa da área farmacêutica. Em seu tempo livre, gosta de praticar esportes, viajar e estar com família e amigos.
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Terráqueos de castigo. Valinhos/SP/Brasil 25.03.2020

No final do ano passado, antes do Natal, recebemos dois casais de amigos em casa. Naquela ocasião não me lembro de nenhuma notícia falando sobre o coronavírus.

Mal sabíamos que 3 meses depois, sentiríamos muita falta de momentos “simples” como esses. O assunto do momento era um tal vídeo do canal Porta dos Fundos, que tinha como enredo um Jesus Gay. Após o almoço, o tema do polêmico vídeo voltou à tona e alguém perguntou: vocês assistiram? Não? Então, vamos assistir. E assim o fizemos. Aqui cabe um parêntesis: não vou entrar no mérito se o vídeo é isso ou aquilo, se gostei ou não gostei ou se é certo ou errado. A reflexão que proponho aqui é outra. Qual o valor que damos às coisas que realmente importam?  Qual o grau de importância que damos à nossa família e as coisas mais simples, que não têm valor material? Mas o que tudo isso tem a ver com o tal vídeo de Jesus? Eu explico: ao terminar de assistir o vídeo e mediante a polêmica instalada naquele momento (que era grande), eu brinquei com um dos amigos e disse: “imagine só – Jesus lá de cima, vendo tudo isso e pensando – é serio que vocês estão se digladiando por causa de um vídeo que me retratam como gay?” Voltando à nossa reflexão: qual o grau de importância que Jesus, do alto de sua inteligência superior, daria para um fato desses? Por coerência, a resposta é muito simples: muito provavelmente não daria a menor importância, porque ele está muito acima de tudo isso. Mas e nós? Qual a importância que damos para aquilo que realmente tem valor: as coisas mais simples, como um abraço, um almoço entre amigos ou um passeio de bicicleta na chuva? E de repente, não mais que de repente, fomos obrigados a nos olhar uns para os outros. Mas olhar de verdade (olho no olho mesmo). Conviver de verdade. Se preocupar de verdade. E como uma criança que é colocada de castigo, fomos compulsoriamente convocados: terráqueos, parem e pensem no que vocês estão fazendo.

Ok, estamos todos pensando. Que possamos aprender a lição. Será?

Vinícius Eugenio – Belo Urbano48 anos, publicitário, redator, atua com criação há mais de 25 anos, mas sem dúvida, a sua melhor criação, feita em dupla com a Leila, foi a Valentina. Espirituoso, prático e pragmático, gosta tudo de preto no branco, até por isso, é corintiano razoavelmente apaixonado. Saudosista confesso, colecionador de objetos antigos e admirador nato de Fuscas antigos. 
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Ideias para fazer o bem – Campinas/SP/Brasil 24.03.2020

A pedido da profissional, prima e amiga fui convidada a escrever sobre toda esta assustadora realidade que estamos enfrentando, amo estes desafios e como amo escrever, cá estou!

Mulher, advogada, empresária, mãe e dona de casa acostumada a madrugar e não parar até a hora de descansar. Ser obrigada a parar em casa por completo. Fácil, não, difícil, muito difícil!

Os primeiros dias, a falta de rotina dá margem a ansiedade, às crianças assustadas e o marido ainda sem muita consciência de tudo que está ocorrendo a nossa volta, homem tem tendência a negação.

Os dias vão passando e a angústia daqueles que dependem de nossa empresa, pagamento de vales transportes, vales alimentação do nosso Grab a Dog no Aeroporto Internacional de Viracopos, em breve os salários e o aluguel…., o que fazer sem poder sair de casa mas ao mesmo tempo manter nossa equipe lá, trabalhando, pois dependem dos seus empregos para se manter e manter suas famílias e filhos, ou seja, sobreviver!

Muitas recomendações reforçadas, fazendo tudo aquilo que está a nosso alcance visando proteger nossa equipe e clientes, por outro lado, a contradição: de que o mais correto é a recomendação de que todos permaneçam em suas casas!

O aniversário da nossa querida Bisa em Bebedouro, a 300 km de distância, nosso amor de avó desde que a conheci quando comecei a namorar meu marido Fábio aos 30 de novembro de 1998, que no último dia 20/03/2020, comemorou muitos anos e como sempre tudo desde o início do ano programado, para estarmos ao lado dela, não foi possível.

O coração aperta de tanta angústia, como é difícil se manter afastado! Manter o afastamento social, ficar longe para proteger quem amamos!

Para uma virginiana sempre super programada, os imprevistos e esta necessidade de se manter isolada chega ser a oportunidade de percebemos que o ser humano tem muita capacidade de mudar seu estilo de vida e ser feliz!

O que nos resta é nos reinventar, desde o primeiro dia que estou em casa com meus filhos, muitas boas ideias estão surgindo e percebo como os seres humanos tem uma grande capacidade de criar e fazer o bem quando desafiados.

Combinei com minha família na quinta, 19/03/2020 uma pequena rotina: iniciamos com a aula sobre a importância da lavagem das mãos, com direito a aula pratica e muitas risadas por aqui. Logo após as atividades escolares que tentaremos realizar nos períodos das manhãs e às tardes poderiam assistir tv, ler um livro, jogar um jogo, treinar nosso violão e na sexta um cinema em casa com pipoca ou uma gordice, como amo chamar alguma extravagância alimentar que de vez em quando nos permitimos por aqui.

Surgem ideias para fazer o bem daqueles que mais precisam, já compartilhei o telefone de um supermercado delivery com minha Tia Maura caso seja necessário e também me coloquei à disposição pois afinal não me enquadro como sendo de nenhum grupo de risco e oferecer ajuda aqueles que tem mais de 70 anos, e um alto risco de letalidade acaba fazendo toda a diferença.

Por fim, o mais novo projeto que já começamos a colocar em prática por aqui a doação de sabonetes antissepticos, aqueles que não tem condições de comprar e com isso irmos fazendo a diferença em tempos muito difíceis que temos que nos reinventar e semear, mesmo que a distância o bem e o amor! Por aqui já começamos e como não podemos sair de casa, estamos fazendo uma distribuição digital que fará a diferença.

Já reduzi a jornada de trabalho de minha ajudante por aqui mas no dia que ela vem para me ajudar, está levando vários sabonetes antibactericida para doar as pessoas que precisam, não tem condições de comprar e muitas vezes desconhecem inclusive o bem que tudo isso faz em relação ao combate à estes vírus e doenças.

Um gesto de carinho para proteger quem precisa neste momento em que quem tem mais consciência e talvez oportunidades, possam fazer a diferença mesmo que afastados uns dos outros e assim com pequenos gestos neste momento de tanta dificuldade, vamos enchendo o mundo de amor e proteção!

Mantenham – se distantes para depois podermos celebrar o amor!

Beijo de longe com carinho e preocupação.

Ana Carolina Rogé Ferreira Grieco – Bela Urbana, mulher, advogada e empresária. Virginiana que ama jogar tênis e ficar com a familia!
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Bolo, unha e Corona Vírus? – Valinhos/SP/Brasil 23.03.2020

Eu começo o dia lendo notícias ruins nos sites, na TV e logo em seguida, parto para minha energia diária…o site Só Notícia Boa…, lá mostra o lado bom de tudo, inclusive sobre este assunto e aí as informações ficam balanceadas…mas meu coração prefere terminar o momento de atualização “com notícias positivas…o dia fica bem melhor”!

Mas, estou em casa e a minha realidade é o que realmente importa.

Minha mãe de 83 anos em casa, filhos sem aula em casa e…de repente o WhatsApp toca. Era minha manicure confirmando o horário de amanhã.

Pensamento 1- Meu Deus, eu não posso ir, não posso fazer isso com minha mãe…será que seria perigoso pra ela? Será que eu seria culpada se eu passasse algo para ela? E meus irmãos? E minha família?

Pensamento 2- Puxa, como sou egoísta, eu é quem poderia levar o vírus pra minha manicure, afinal, ela tem uma mãe acamada e corre mais riscos do que a minha… Ela seria culpada por trabalhar? E o dinheiro dela no fim do mês? E se alguém da família dela pegasse de mim?

Pensamento 3- Nossa, será que preciso mesmo correr este risco? Eu não sei se tenho alguma coisa que ainda não apareceu.

Pensamento 4- E meus clientes? Vai aparecer minhas unhas sem fazer nas reuniões online?

Foi assim minha tarde, uma mistura de sentimentos…às vezes egoísta, às vezes com medo… e foi aí que o amor e a gentileza falou mais alto…

Comecei a pegar os ovos, a manteiga, o leite, a canela, a noz moscada, a ameixa, a farinha de trigo….misturei tudo…, mas achei ainda faltava alguma coisa especial…coloquei então castanhas e mel, que nem tinha na receita. Dei um toque final com fermento em pó, muito amor e bons pensamentos…

Em seguida, untei a forma e coloquei tudo lá dentro. Com o tempo, o cheiro foi se espalhando pela casa toda e todos perguntando que eu estava fazendo e a resposta foi… estava fazendo quarentena, cuidando da família (fiz dois) e fazendo gentileza!

Pode ser que enquanto você esteja lendo este texto, ainda tenha sobrado um pedacinho de bolo no salão da Paula…

Mas se quiser a receitas, me liga…a gente aproveita, bate um papo, você passa o tempo e minha quarentena em casa ficará ainda mais divertida!

Agora, sem unha bonita, mas com muita consciência e muita gentileza!

Roberta Corsi – Bela Urbana, coordenadora do Movimento Gentileza Sim que tem como objetivo “unir pessoas que acreditam na gentileza” e incansavelmente positiva, para conhecer o movimento acesse https://www.facebook.com/movimentogentilezasim 
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Como minha vida mudou em alguns dias – Campinas/SP/Brasil 22.03.2020

Quando a epidemia do Covid-19 virou pandemia, uma de minhas filhas me perguntou o que era isso e eu como sempre fui ao dicionário buscar primeiro o significado da palavra para começar a explicar a ela, ao ler, fui me dando conta da amplitude de significados para nossa vida aqui no Brasil, com tantas notícias sobre o Corona vírus já sabíamos que outras nações estavam sofrendo seus efeitos de maneiras devastadoras porém era lá, não aqui, não ainda; os dias foram passando e as mudanças para nós aqui começaram, as escolas fecharam, todos os dias uma nova providência a ser tomada, o clube fechou, os parques públicos fecharam, os shoppings vão fechar, a instrução é o isolamento social, as crianças estão sem aula desde o dia 16/03 e ainda no fim de semana uma amiga da minha filha veio dormir aqui em casa e depois no domingo foi a vez da minha filha dormir na casa dela, na segunda-feira já começamos a entender melhor o quê significa isolamento social, portanto expliquei para minhas filhas que não estavam de férias e não era feriado forçado, que as amigas não poderiam mais vir em nossa casa e nem elas saírem para a casa das amigas, as coisas têm acontecido muito rápido, fui ao supermercado bem cedo ontem e encontro filas e filas quando antes no mesmo horário estava vazio, o álcool gel sumiu das prateleiras, apenas alguns dias antes comprei 500ml por R$ 13,00 e agora após muito procurar encontrei em uma farmácia 200ml por R$ 20,00, fui ao hortifruti e não tinha batata, e nem para repor, nunca vi isso em todos esses anos que frequento esse lugar, vi pessoas com máscara e pessoas se afastando das outras, obviamente seguindo as instruções para evitar o contágio, vi medo em meu olhar, vi medo do olhar dos outros.

Ao ouvir um áudio da irmã de uma amiga que vive na Itália, tive um momento de pânico, ela descrevia um cenário de guerra que só vi em filmes até hoje e não era uma notícia falsa, não era filme, o marido dela têm que preencher um formulário e entregar em um posto policial todos os dias quando sai para trabalhar pois todos estão isolados e precisam de autorização para sair de casa, o supermercado recebe apenas 5 pessoas por vez e os outros fazem filas do lado de fora, todos de máscaras e luvas, chegam a esperar duas horas para entrar, durante esses últimos três dias tenho tentado respirar conscientemente várias vezes ao dia para controlar os pensamentos em minha cabeça, sou duas o tempo todo: uma que faz suas atividades normalmente, cozinha, paga contas, limpa a casa, conversa com marido e filhas, cumpre sua rotina de isolamento imposto e a outra que percebe como um vírus parou o mundo e se desespera ao pensar nos desdobramentos, nos efeitos a curto e longo prazo na economia mundial,  as empresas que não resistirão ao impacto disso, as agências de viagem que vão falir, os pequenos empresários que demitem funcionários diariamente, os restaurantes que irão fechar, enfim, um efeito dominó que pela primeira vez em minha vida sou testemunha e tento manter minha sanidade mental para não transmitir esse sentimento às minhas filhas para fingir que apesar da nossa vida ter mudado tanto, tudo está bem quando sei que não, nada está bem, é um momento de pouco controle e por isso sei que é imprescindível manter a sanidade mental, buscar a qualquer custo a serenidade, cada um à sua maneira e fazer a minha parte, cumprir as regras de higiene e de isolamento social dentro do possível e ter esperança em dias melhores, ter fé que algo há a aprender em toda e qualquer situação e seguir adiante por mais um dia, tentar focar em tudo o que posso ser grata em cada dia e não sair como uma louca para buscar papel higiênico e álcool gel em todos os supermercados que encontrar.

Percebo quão frágil podemos nos tornar perante a um vírus, perante a tragédia, percebo como a falta de controle sobre uma situação nos desestabiliza e percebo também a força que temos quando nos agrupamos todos com o mesmo objetivo, outras nações provaram isso como Taiwan, que foram eficientes em controlar o vírus, cada um fazendo um esforço individual, nunca vi uma situação de isolamento se tornar o elo de união entre as pessoas, todos combatendo um vírus e essa lição é a que quero manter em minhas experiências, quero crer que o velho clichê funciona sim, que juntos somos mais fortes, o ser humano precisa de outro para viver, ser feliz e prosperar, isolados sim, sozinhos nunca. Tenho fé que sairemos fortalecidos dessa situação extrema, isso também é aceitar a dádiva de estarmos vivos, aceitar os altos e baixos e fortalecer nossa resiliência.

Eliane Ibrahim – Bela Urbana, administradora, professora de Inglês, mãe de duas, esposa, feminista, ama cozinhar, ler, viajar e conversar longamente e profundamente sobre a vida com os amigos do peito, apaixonada pela “Disciplina Positiva” na educação das crianças, praticante e entusiasta da Comunicação não-violenta (CNV) e do perdão.